Ser Flamengo é ter alma de herói

"Há de chegar talvez o dia em que o Flamengo não precisará de jogadores, nem de técnico, nem de nada. Bastará a camisa, aberta no arco. E, diante do furor impotente do adversário, a camisa rubro-negra será uma bastilha inexpugnável."

Outras Histórias de 1984

OUTRAS HISTÓRIAS DE 1984

Com o Zico jogando na Europa, o Zé dizia que tinha agora dois clubes para seguir. É lógico que o Flamengo estava, está, e estará sempre acima de tudo, mas encarávamos a estadia do Galo em Udine como um estágio passageiro, e queríamos continuar incentivando-o até o dia da sua volta. Assistimos a quatro jogos da Udinese, nas duas temporadas que ele passou por lá. Nas férias do futebol aqui no Brasil, passamos trinta dias em Udine, num frio de rachar, seguindo aquele simpático timinho.

Um jogo marcante foi Udinese X Roma, na época Campeão da Itália, e com o Falcão e o Cerezo. O Flamengo tinha um jogo no Maracanã no mesmo dia, mas o Zé Carlos cismou de ver o jogo na Itália. Começou logo o trabalho de tortura psicológica, me pentelhando para ir. Tanto ele fez, que acabei aceitando. Ele ia bancar tudo e tive que topar na hora. O cara me devia uma grana preta.

O diabo é que eu não queria ir. O Flamengo jogava, se não me engano, contra o Botafogo, num jogo que não valia nada, mas era sempre bom ver a cachorrada sofrer. Decidi só dar a resposta que não ia na sexta-feira. Foi o meu erro. Às quatro da tarde, ele me aparece no escritório com as passagens. Saímos de noite para Milão e, de lá, seguimos no já manjado trem para Udine. Procuramos o Zico, que estava concentrado e não pôde nos receber. Mas a Helena, sua secretária, quebrou o galho e nos arranjou dois ingressos para a partida.

Como prêmio pela nossa ida, a Udinese resolveu ganhar o jogo: 1 a 0, gol de Zico. Terminado o jogo, nova correria em direção ao trem. Pegamos o direto para Milão e conseguimos lugar no vôo Milão/Rio, a uma da madrugada. Segunda-feira cedo, estávamos no Rio, com a cara mais safada do mundo.

Mais uma vez fomos chamados de malucos, tarados, vagabundos e outras coisitas. O pessoal ainda não estava acostumado...

Uma excursão hilariante aconteceu numa ida do Flamengo a Brasília e Goiânia. Fomos eu e o Zé Carlos, de avião, e a galera num ônibus, para fazer as duas partidas. Naquela época, o Rio estava sendo varrido por uma epidemia de conjuntivite. Todo mundo pegava a “coisa”. No ônibus, então, estava todo mundo “enrremelado”. Uma nojeira. Todo mundo, não; o único que não pegou a “doença” foi o Branco, na época apenas um componente da torcida (e, mais tarde, chefe geral da Raça Rubro-Negra). Ele era funcionário administrativo do Banco Real e tinha pedido licença médica de cinco dias, alegando justamente que estava com conjuntivite. Era o tempo suficiente para assistir aos dois jogos. Veja bem: todo mundo reclamando do lance e o cara desesperado pra pegá-lo! O que ele fez para pegar a bendita doença era de matar de rir. Esfregava as camisas sujas de remela da galera que estava doente, passava a mão na cara dos caras e depois coçava os olhos...Se não fosse tão nojento, tão trágico, era para morrer de rir.

Fugíamos dele e daquela nojeira toda como o diabo foge da cruz. Foi realmente hilariante.