Copa de 2002 - Japão
Sem que ninguém me pentelhasse, eu decidi ir à Copa do Japão. Lugar mágico, porque lá vi meu Mengão ser campeão do mundo, em 1981. Eu tinha que voltar para ser campeão de novo; agora, pela Seleção Brasileira. E agora, era o contrário. Eu queria ir e a galera é que não estava a fim. Muito caro.
Tivemos o sofrimento das eliminatórias para a Copa. Troca técnico, muda técnico, e o time ó... Uma merda. Não dava para entender. Os melhores jogadores do mundo e perdendo para a Bolívia, Paraguai e quejandos... Aí, veio o Felipão. Um ser humano maravilhoso e um grande motivador. Está aí o grande mérito dele. É, talvez, o técnico mais carismático do mundo. Sabe tirar “água de pedra”. Com ele, até cabeça de bagre joga bola. Posso até desejar mais na parte técnica, mas...
As eliminatórias foram sofríveis. Perdemos vários jogos e culminou com aquela derrota idiota contra a Bolívia, lá em cima do morro. Ali eu decidi que ia à Copa, nem que fosse sozinho. Estava assistindo ao jogo no “Plebeu”, um restaurante que fica em Botafogo. Lotado. Um milhão dentro e cinco milhões fora. Havia uma molecada, cerca de uns 15 garotos, com idade de 18/20 anos, todos petistas, com crachá e estrelinha do partido. Pois não é que a molecada estava torcendo, descaradamente, contra o Brasil? Na hora do segundo gol da Bolívia, veio o tiro de misericórdia. O líder deles berrou:
- Porra, esse time tem que perder mesmo. No próximo ano vamos ter eleições e o Brasil precisa se fuder para o povão aprender a votar...O Lula tem que ganhar, caralho!!!
Veja só que cretino. Estava torcendo contra o Brasil por causa da política. Queria que o Brasil não se classificasse para o Lula ganhar a eleição...Claro que rolou um estresse danado. A galera ficou muito puta. No final, o Brasil perdeu de 3x1.
Chamei o Marquinhos, que trabalhava comigo. O diabo é que o moleque já tinha aprontado na Copa anterior. E se na hora agá o moleque desistisse de novo? Falei com o Zé Carlos, Munir, Hélio Moraes e Paizão Ernesto. Ninguém queria ir, devido ao preço.
Sabe Deus como nos classificamos. Agora era arrumar grana e as malas pra viajar. Eu, particularmente, achava que ganharíamos a Copa. Era a mesma base de 98, mais experiente e com uma vontade danada. O diabo era a grana mesmo. Coréia e Japão, uma fortuna! De pacote ficou impossível. Somente a parte do Japão custava US$25,000.00. Isto mesmo. Vinte e cinco mil dólares! Impossível.
À medida que se aproximava a data de abertura, somente o Marquinhos estava firme para ir. Chamei o ele na xinxa:
- Olha aqui ó, veadinho. Tu vai mesmo ou vai me deixar numa outra roubada?
- Vou, cara. Já falei com minha namorada e tá tudo certo. Desta vez, se ela
ficar cheia de frescura, vai rodar...
- Só que tu falou isso na Copa da França e na hora agá...
- Nada a ver. Nesta vou, de qualquer maneira.
- Ok. Quanto tu tem de grana?
- Nada, mas tu me adianta e desconta das minhas comissões.
- Porra, então tu vai trabalhar pra mim por dois séculos seguidos... E não vale me denunciar por “trabalho escravo”, ok?
- Ok, patrão, vamos nessa...
- Tudo bem, mas nós só vamos ver os jogos do Japão. Não estou a fim de ir para
a Coréia, certo?
- Certo, chefia, você manda.
- Então, amanhã, vai ao Consulado do Japão e pega os formulários pro visto.
Vamos nessa. Outra coisa: o Japão é caro pra caralho. Vai pianinho, ok? Nada de frescura. Vamos viajar 36h de avião, depois mais 16h de trem, até Kobe (local do primeiro jogo do Brasil no Japão). Tudo bem?
- O que tu falar, tá falado. Vamos nessa.
Pela segunda vez na vida, assisti o primeiro jogo do Brasil pela televisão (a primeira foi na Copa dos Estados Unidos). Quase morri. Não estou acostumado. E tome festa no tal do Alzirão (alguém quer me dizer onde fica essa porra??? Só sei que é na Tijuca, mas onde???). Ganhamos de 2x1 da Turquia. Um jogo chato pra cacete.
O segundo jogo também assisti pela TV: Brasil x China... À noite embarcamos para o Japão. Não dava pra assistir mais daqui. Impossível. Fomos via Estados Unidos. No Galeão já começou a festa. Eu e Marquinhos de bermudas, camisa do Flamengo e bandeira do Brasil amarrada na cintura. Tipo: sou torcedor... E maluco...
O chefe de Comissários da United, vendo nós dois, correu para nos atender. Eu senti que o cara era... Digamos... Meio bichona. Papo vai, papo vem, pintou logo uma “executiva” até o Japão. Deus é brasileiro... Dentro do avião éramos os reis. Todo mundo queria bater papo, mas ninguém ia para o Japão ver a Copa. Inacreditável.
Depois de 30 dias, 40 fusos horários e muita comida, chegamos a Tóquio-Naritas, às 10h da noite, mortos de cansados. Em Miami soubemos que o Brasil havia ganhado da Costa Rica... Mole, mole. Soubemos também que Portugal, França e Argentina tinham ido embora mais cedo. O caminho do título ficava mais fácil...
No Japão fecha tudo à meia-noite. Eles são super organizados e, em Narita, havia intérpretes em todas as línguas. Nós tínhamos duas opções: ou íamos para um hotel, passar a noite, ou dormir em algum lugar e, no dia seguinte, pegar um trem para Kobe. O hotel mais barato era US$350.00 por uma noite. Nada feito. Olhei para o Marquinhos (o cara já tinha perdido 100 quilos) e, com uma pena de cão, falei:
- Moleque, tem força pra agüentar o tranco???
- Claro cara, estamos no mesmo barco.
- Ok, vamos então pra Tóquio tentar pegar um trem pra Kobe, agora.
- Vamos nessa.
Pegamos um trem em Naritas e fomos para o centro de Tóquio. Aí começou a nossa sorte. Encontramos um casal que falava inglês e era apaixonado pelo Brasil. Os caras ficaram sendo nossos intérpretes. Chegamos em Tóquio e já estava quase tudo fechado. Não tínhamos dinheiro japonês. Eles trocaram US$100.00 e nos levaram até uma rodoviária, onde pegaríamos um ônibus, pois o trem, além de custar US$300.00 por pessoa, só saia às 8h do dia seguinte. Com tudo arranjado, eles foram embora, cerca de 11h da noite. Quando fomos pegar o ônibus não havia mais passagens. Que inferno. Nossos planos tinham ido abaixo.
Ficamos na rua à noite. Um frio de lascar. Aí resolvemos ir para a estação e esperar o trem de manhã. Chegamos lá à 0h30 e deitamos no saguão. Iguais à gente havia uns 100 argentinos, ingleses e alemães. Não demorou muito, chegou a polícia e botou todo mundo pra fora. Novamente, fomos pra rua esperar o tempo passar.
Por volta de 5h da manhã a estação abriu e fomos comprar os bilhetes para Kobe. Havia dois preços: o trem rápido, 8h de viagem, ficava a US$300.00 por pessoa. O trem parador, o famoso “cata corno”, 16h de viagem, era US$190.00 por pessoa. Escolhemos o parador, por questão de economia. O diabo foi que tivemos que trocar de trem 8 vezes. Um ia até determinado lugar e, quando parava, tínhamos 2 minutos para pegar o outro. Eu dormia 2h, enquanto o Marquinhos ficava acordado. Depois trocávamos. Dava pena de ver o moleque...
Depois de dois séculos chegamos a Kobe. Lindíssima, talvez a cidade mais bonita do Japão. Descemos do trem e fomos procurar um hotel. Achamos um, ao lado do hotel da Seleção Brasileira, por um preço bom: cerca de US$280.00 o quarto duplo. Tomamos banho e fomos a um mini-mercado comprar coisas para comer. Quase morri. Uma maçã custava US$18.00. Que roubo...
Depois fomos ao hotel da Seleção ver o lance de ingressos. Antes de ir, eu tinha falado com o Zico sobre isso. Ele, muito gentil e amigo, como sempre, ligou para o Américo Farias, Supervisor da Seleção, que ficou de nos arranjar os ingressos, pelo preço de face, o que fez até a final da Copa. Além disso, a esposa dele, Cláudia, pediu para levarmos uma encomenda pra ele, o que tornou nossa tarefa muito mais fácil. Os ingressos estavam muito caros. Os de segunda custavam US$150.00 e os de primeira US$300.00 (na segunda fase). Realmente proibitivos para brasileiros.
E o que fazer no Japão??? Nada. O Japão é uma São Paulo organizada, rica, alfabetizada e limpa, mas não tem nem “cardo de cana com pastel”. Não tem nada pra fazer. Os caras trabalham e...Dormem... Dez horas da noite, tudo fechado. Os trens param às 11h. Pra sair, só de táxi. Quem tiver grana pode fazer compras e mais nada. Uma organização de matar. Para se ter uma idéia, por questões de segurança, não foi possível assistir a nenhum treino da Seleção Brasileira.
Então, nós acordávamos e íamos para o hotel da Seleção Brasileira. Ficávamos lá o dia inteiro e, à noite, voltávamos. Por causa do fuso horário, os noticiários da televisão eram de manhã. O Marquinhos não podia ver uma câmera de televisão. Ficou logo amigo da Fátima Bernardes e do pessoal da imprensa. Tinha programa ao vivo, lá estava o “papagaio de pirata...” Em tudo que era programa, pintava o “babaca” na tela. A mãe dele, Marilda, deixou de fazer comida, limpar a casa, tudo, só pra ver o filho na televisão...Ora, Dona Marilda, vá procurar o que fazer, pô!
E ele começou a fazer sucesso com o mulherio. Também, pudera. No Japão só tem gente feia. Chegou um moleque bonitão, olhos azuis, saradão... O bicho pegou. Voltamos para o nosso hotel e, na recepção, havia chegado um grupo de brasileiros (aleluia...) do Sul, para assistir à Copa. No grupo havia uma garota bonitinha... Perdi meu parceiro!!! Ele só queria saber de fuc... fuc... Sabe cachorro quando vê uma cadelinha no cio...? É isso mesmo. O cara ficou maluco. E o pior, a garota topou. Caramba, nos três dias que passamos em Kobe eu tive que dormir no saguão do hotel, pois os caras estavam se pegando no meu quarto. Pode???!
Primeiro jogo: Brasil x Bélgica. Eles fizeram uma marcação eficiente nos nossos laterais e saíam para o jogo no contra-ataque. Lá pelas tantas, eles fizeram um gol legítimo e o juiz anulou... Se valesse...Sei não... No segundo tempo, duas boas jogadas, dois gols e fechamos o caixão.
No dia seguinte pegamos as mochilas e fomos para Shizouoka, local do próximo jogo contra a Inglaterra. Fomos de trem. US$300.00 por pessoa. Nos perdemos do pessoal do Sul, que foi em outro horário. O Marquinhos ficou maluco... Chegamos e um brasileiro que morava e trabalhava na cidade nos arranjou um hotel “barato”: US$350.00.
Essa vale contar. No Japão, as “garotas de vida fácil” não ficam na rua, como no Brasil. Normalmente, ficam nos bares e em saguões de hotel, como “intérpretes”. No lobby do hotel da Seleção havia várias e o Marquinhos estava cercando uma nissei lindíssima, brasileira, filha de japoneses. Morenaça, cabelos longos, uma graça, que devia ter uns 19 anos.
Eu falei pra ele:
- Moleque, essa aí deve ser cara. Vai devagar.
- Que nada, cara. Ela é garotinha. Deve ser até virgem.
- É, virgem igual à minha mãe, depois que eu nasci. Cara é só chegar, combinar preço e levar para o hotel.
- Que nada, cara. Com essa eu caso. Não é garota de programa não!
- Deixa de ser babaca, moleque. Quer apostar como é fácil?
- Quero! Chega lá, fodão.
Fui lá e falei:
- Oi, você fala português?
- Claro, sou paulista, mas vivo aqui há 15 anos.
- Meu amigo quer te conhecer. Tudo bem? - e apontei para o Marquinhos.
- Claro, eu já estava de olho nele, mas ele é tímido, né?
- Bem, agora que vocês se conhecem, podem ir dá uma volta, ok?
- Por mim, tudo bem.
Peguei ele pelo braço e disse, no canto:
- Tá vendo, ô babaca! Sai e leva direto para o nosso hotel. Tu tem até 3h da manhã para “fazer o serviço”. Depois vou dormir, ok?
Ele pegou a garotinha e saiu. Eu fiquei no hotel da Seleção batendo papo até dar 3h. Voltei para o meu quarto, cheguei na porta e fiquei ouvindo. Eram risos e “clic” pra lá, “clic” pra cá. Que porra é essa...? Bati na porta e o Marquinhos abriu. Estava tirando fotos da garota. Os dois vestidos. Eu fiquei meio cabreiro, mas... Ele se despediu da garota, botou ela num táxi e voltou. Eu perguntei:
- E aí... comeu???
- Não, cara. Num é assim. Levei a garota para jantar e depois ficamos batendo
papo até agora. Aí tirei as fotos para mostrar pra galera.
- Deixa ver se eu entendi..?. Tu trás uma puta para o hotel fica com ela no
quarto mais de 3h, bateu foto... E não comeu???
- Num é assim, cara. Ela deve ser virgem...Tirei fotos pra mostrar pra galera do Brasil a gatinha que eu peguei...
- Ô babaca, virgem é tua mãe, ô arrombado. Vai dormir senão eu te arrebento. Porra, tu ta preocupado em mostrar as fotos pros teus amigos no Brasil... vai ser fuder otário...
Fiquei muito puto...Porra passei a noite em claro pra adiantar o cara e o otário vai tirar fotos...
No dia seguinte, véspera do jogo, voltamos para o hotel da Seleção. Qual o outro programa??? Quem estava lá? A garota do Sul e a japonezinha... O moleque agora podia escolher... O Américo Farias nos chamou, pegamos nossos ingressos e as duas garotas atrás do cara. Ele não sabia o que fazer. Aí, o “cafetão” aqui deu um novo jeito. Chamou a japonezinha e disse:
- O Marquinhos quer te ver no nosso hotel, tudo bem?
- Tudo bem. Pode ser agora?
- Pode.
Chamei o moleque e disse:
- Ok, tá armado. Leva ela pra lá e não me decepciona, certo?
Aí, ele se “recuperou” da mancada do dia anterior. Comeu a gatinha e ainda deixou a prova do crime... Que babaca... Detalhe: não perguntou nada para a garota. Não pagou nada. Aí, eu fiquei cabreiro. Pensei: essa garota vai cobrar com juros e correção monetária, é esperar...
Dia do jogo: por volta de 7h da manhã eu acordei com o telefone tocando. Era a japonezinha querendo falar com o Marquinhos. Papo vai, papo vem, marcaram no nosso hotel. Eu disse para o moleque:
- Tu tem duas horas pra ficar com ela, pois às 12h vamos para o estádio, ok? -
e fui ao Hotel da Seleção. Fiquei lá batendo papo, mas meu Anjo da Guarda estava me pentelhando para eu voltar. Algo me dizia que alguma coisa estava errada. Por intuição, resolvi voltar. Quando chego à portaria do hotel encontro o Marquinhos.
- Ei, cara, que qui tu tá fazendo aqui? Tu não estava com a garota?
- Ela está lá em cima. Me pediu para vir ver se o namorado dela estava por
aqui, vigiando ela...
- Ô seu babaca... Este golpe é mais velho que andar para a frente. A garota tá te
roubando, porra! E saímos correndo pro nosso quarto.
Já era: ela tinha se mandado, não sei como. E levou Y10.000. Até hoje sacaneio ele. Otário...
Brasil x Inglaterra: depois de 32 anos, novamente eu estaria assistindo, “ao vivo”, esse jogo. Sou um dos poucos torcedores que teve esse privilégio. O filme do México (Copa de 70) passou na minha mente. Jogo mordido, taticamente impecável. Ninguém podia dar mole. Qualquer falha seria fatal. Em 70 as chances de gols foram raríssimas. Com certeza, seria também assim.
Antes do jogo e “sem sacanagem” (depois do estresse do roubo), eu e o moleque falamos sobre a partida. Aí o Marquinhos me disse:
- Fica pilhado não, cara. Eles vão jogar na retranca. O Becham vai jogar de lateral direito, marcando o Roberto Carlos, quer ver? E se ele não jogar, a Inglaterra morre.
Fomos para o estádio. Havia cerca de 10 mil brasileiros. Antes de começar a partida, as câmeras de televisão ficam dando closes na galera. Um deles pegou o Marquinhos, que estava sem camisa. Mostrou, por cerca de 2 minutos, o moleque no telão. Pô, foi do caralho! O mulherio ficou maluco. Eu disse:
- Porra, moleque. Se o Brasil ganhar, tu vai comer umas dez. É só escolher...
- Será?!!!Tomara que seja verdade. Vou torcer mais ainda...
Começou a partida. Ninguém saía pro jogo (igualzinho à Copa de 70). O jogo seria decidido nos detalhes, com uma falha individual. E o coração...4 milhões de batidas por segundo. O Becham marcando o Roberto Carlos... Olhei pro moleque:
- Vai ser uma foda!!!
Na nossa fila de cadeiras colocadas havia três pessoas: um negão e dois brancos; um deles, Cláudio, foi lateral direito do Palmeiras e da Seleção Brasileira (hoje empresário de jogadores, inclusive do Marcos, titular da Seleção). A bola rolando, todo mundo nervoso e, de repente, o Roque Jr. quis fazer uma gracinha e quase entrega o ouro. Eu, com todos os meus pulmões:
- Joga sério, ô filho da puta... tu num sabe e quer inventar...
Aí o negão, do lado:
- Filho da puta, não. Filho da puta, não. Num mete a mãe no meio não...
Não entendi nada. Continuei na minha e vi, de rabo de olho, o Marquinhos conversando com os caras, principalmente com o negão... Caguei!!! De repente, o Lúcio faz aquela lambança e bimba... Gol da Inglaterra. Pensei: fudeu! Vou voltar mais cedo pra casa...
O Brasil saiu um pouco mais para o jogo. Numa jogada genial do Ronaldinho Gaúcho, no finalzinho do primeiro tempo, o Rivaldo empatou. Ufa!!! Ufa!!! Fiquei mais tranqüilo.
Assim que acabou o primeiro tempo, a gente se levantou e o Marquinhos me disse:
- Moraes, este é Seu Roque, pai do Roque Jr.
Eu falei:
- Já imaginava. Não liga, Seu Roque, a mãe verdadeira dele ficou em casa. A que
tá aqui é pra gente xingar mesmo - ele riu e o ambiente se descontraiu. Ficamos amigos e juntos até o final da Copa.
Veio o segundo tempo. No comecinho, surgiu o segundo gol nosso. Espírita!!! O Ronaldinho Gaúcho foi cruzar e...bimba... Gol!... Logo depois foi expulso... Mesmo com um jogador a mais, a Inglaterra não saiu para o jogo. Continuou com aquela jogada do “chuveirinho”. Ganhamos. Obrigado, São Judas Tadeu.
Dia seguinte: trem a US$300.00 para Saitama Shintochin, ver a semi-final Brasil x Turquia. Mesmo filme: hotel caro (US$350.00), hambúrguer caro (US$18). Não agüentava mais comer hambúrguer... Socorro!!!! Um inferno... Hotel da Seleção. Ingressos na mão. O Marquinhos reencontrou a Juliana e começou tudo de novo. Os caras transaram até dentro do banheiro feminino do hotel da Seleção. Haja cio, pô!!!
Foi o jogo mais chato da Copa. Era para ser 30 a zero, mas a máscara foi maior. Eu nunca vi um jogo tão fácil se transformar num martírio. Era toquinho pra lá, toquinho pra cá. Neguinho tentando fazer gol por cobertura, uma meleca! Jogador brasileiro não aprende, porra! Quantas Copas perdemos por causa de rebolado... De repente podia tomar um gol e aí... Deu ódio e ganhamos só de 1 a zero, gol do Ronaldinho, de bico...
Ganhamos e agora era a final contra a Alemanha. Sou o filho predileto de Deus: novamente numa final de Copa do Mundo. Nas últimas três Copas fui à final em todas. Ganhei na América, fui vice na França. Tinha que ganhar no Japão.
Pegamos o trem para Tóquio-Yokohama. Decidimos que faríamos as compras antes do jogo. Conseguimos os ingressos e agora era só esperar a partida. Eu tinha certeza da vitória (embora escaldado com a Copa anterior). O time deles era uma baba e o melhor jogador, Ballack, estava suspenso. Não tinha como perder.
No hotel, antes do jogo, falei para meu parceiro:
- Moleque, final de Copa do Mundo. Nós aqui, e o Brasil inteiro torcendo junto.
Quem não queria estar aqui?
- É mesmo, cara. Somos uns privilegiados.
- Olha uma coisa. Os nervos estão à flor da pele. Quando tocar o Hino
Nacional, todo mundo vai chorar. E se o Brasil ganhar, então, vai ser um berreiro só. A emoção é muito grande.
- Sai pra lá, ó. Eu sou é macho, pô. Chorar...Sou espada, cara. Vou é torcer e
gritar muito... Chorar... Isso é coisa de veado...
- Tá bom, ô fodão... Espera só...
Os brazucas chegaram cedo. Deu pena dos muitos brasileiros que moravam lá e não tiveram grana pra assistir à partida. Os ingressos tinham dois preços: os de segunda, US$300.00 e, os de primeira, US$750.00. No câmbio negro o papo era de US$2,500.00 a US$4,000.00.
Entramos no estádio às 6h da tarde. Fiquei no meu canto isolado (quando o jogo é tenso eu não falo com ninguém até terminar. O Marquinhos sabia disso e me deixou “concentrado”).
Com 5 minutos eu senti que ganharíamos. Perdemos muitos gols, eles meteram uma bola na trave e ficaram naquela jogada manjada de time europeu. Chuveirinho pra lá e pra cá... Mas era só questão de tempo. Tinha certeza. A zaga estava bem. Tínhamos um goleiraço, um meio de campo “operário”, mas concentrado e, no ataque, o Ronaldinho. De repente...Um a zero... Eu levantei para comemorar e abraçar o Marquinhos. Cadê ele???
- Buáááá´....Buááá ... - o moleque abriu o berreiro...Eu, também chorando,
dei um abração nele. E falei:
- Ué... chorar num é coisa de veado???
Ele, soluçando que nem criança:
- Tu tinha razão... Indescritível... Meu Deus será que estou vivo ou é só um sonho...?!
Final: BRASIL 2 X 0 ALEMANHA. Novamente Campeão do Mundo. Campeão é o caralho! PENTACAMPEÃO DO MUNDO!!!
Agora falta a Alemanha. A minha décima e, com certeza, a última. Depois da Alemanha, a Copa vai ser na África do Sul.
Não dá...